Narrador Flávio Araújo volta a escrever sobre minissérie 10 Segundos Para Vencer

Por Flávio Araújo  (*)

UMA VERDADE EM TROCA DE OUTRA MENTIRA

Sou obrigado a voltar dando uma continuidade ao meu artigo anterior com o título acima. Em primeiro lugar para um pedido de desculpa. Errar é humano e persistir no erro é burrice. E ser burro é algo onde nunca me inseri. Grazie a Dio. Acontece que vi a minissérie da Globo, feita por meu xará Flávio, o Tambellini, na casa de meu filho Helder, que por sinal tem um blog de nome “Debate Político” com bom número de seguidores. O Helder é um pianista do primeiro time. Basta dizer que em suas teses de mestrado e doutorado na USP seus orientadores foram ninguém menos que JOSÉ EDUARDO MARTINS, irmão mais novo do tributarista IVES GANDRA MARTINS e o outro orientador o maestro JOÃO CARLOS MARTINS, irmão mais novo do José Eduardo. Este vai gravar no próximo mês de maio seu 25º álbum de músicas eruditas. Como sempre vai gravar na Europa. Só grava na Bélgica ou na Bulgária. Lógico que não sou um entendido em música clássica para comentar o que posso, por exemplo, conhecer e me aprofundar em dizer que o Pelé foi o maior do mundo e julgo que jamais aparecerá outro igual. Maradona foi outro craque excepcional, mas para competir com ele, ou com Messi, eu deixo a incumbência para o Rivelino, o Zico… o Tostão, ou mais meia dúzia pelo menos de grandes jogadores brasileiros, Neymar entre eles. A Copa São Paulo mostra que o futuro do futebol no Brasil está garantido, apesar de vendermos laranja ainda no pé. Sim, gosto muito de ouvir Mozart e Chopin e conheço música pelo que meus ouvidos se deleitem. Mas, gosto mesmo é de ouvir os velhos discos do Orlando Silva, o maior cantor que o Brasil já teve. E não discutam comigo que tenho mestre RUY CASTRO ao meu lado. José Eduardo Martins, estava dizendo, já ultrapassando os oitentinhas continua sendo um grande pianista e João Carlos Martins que foi considerado o maior interprete de BACH do planeta, por circunstâncias que todo mundo conhece, teve que deixar o piano e se dedicar a regência. Continua brilhando. Mas, é midiático, o que não acontece com seu irmão que prefere a solidão do seu Brooklin, meu último endereço em São Paulo –fomos vizinhos – e onde o visitei ainda recentemente.

A CORREÇÃO DE UM LAPSO MEU

Pois muito bem, fazendo estas ressalvas eu via a minissérie da GLOBO na casa de meu filho Helder, na Chácara Inglesa em São Paulo e este trabalhando ao piano me pede para baixar o som da tevê. Devo dizer que sofro de um trauma acústico que me provoca um zumbido tremendo nos ouvidos e, inclusive, alguma deficiência auditiva. Pelo uso dos fones em volume muito alto durante os mais de 50 anos de transmissões esportivas. E foi exatamente nesse momento que perdi a sequência que a tevê mostrava e não vi que passaram (embora só um pedacinho, vi depois no Globoplay) a luta de EDER JOFRE e do nocaute diante de ELOY CHAVES em 18 de novembro de 1960 quando o brasileiro conquistou seu título de campeão mundial dos galos. Mundial, sim, mas que depois foi contestado pela versão europeia que apresentou um novo campeão, o irlandês Johnny Caldwell, o “Johnny Boy” que Eder derrotaria algum tempo depois na reunificação dos títulos no Ibirapuera em São Paulo. Em verdade foi muito mais fácil ganhar do chamado “irlandês de gelo” do que derrotar os duríssimos mexicanos. Então, me desculpo do que escrevi de passagem, mas imediatamente me ponho em guarda, de pé e a ordem e parto para um “touché” final.

AS MAIS BERRANTES MENTIRAS NO FILME E NA SÉRIE DA GLOBO

Aristides Jofre, o pai e técnico de Eder realmente fumava em demasia. Acendia um cigarro no outro. Mas, jamais maltratou ou foi rude com seu filho. E preciso dizer que o papel desempenhado pelo veterano OSMAR PRADO na filmagem de Tambellini é simplesmente sensacional, espetacular! Vale o trabalho. Mas, KID JOFRE não sofreu nenhum princípio de infarto ou coisa que o valha que o levasse ao chão do Ginásio de Brasília durante a luta de EDER com JOSÉ LEGRÁ e no decorrer do 14º round. O que mostra um sensacionalismo exagerado e o que é pior, mentiroso. Kid, que viria a morrer no ano seguinte permaneceu no Ginásio até o fim da luta e seguiu orientando o filho, principalmente depois desse penúltimo assalto em que Eder foi realmente a nock-down e foi salvo pelo gongo antes que se iniciasse a contagem. Mas Eder jamais disse a frase “cadê meu pai” quando a personagem de Tonico Zumbano vem orientá-lo no filme e na tevê. Porque quem o fazia era o próprio Kid. Tonico Zumbano, o “Zumbanão” que fica como um substituto do cunhado e no filme vai gritar com Eder nesse momento fulcral do combate. Falso. Na minha lembrança Zumbanão, o soco mais forte da maior dinastia de uma família no boxe brasileiro nem estava em Brasília. Antonio João Oliveira, genro e Andréia, a filha mais nova de Eder não se lembram se estava ou não. Assim como confirmam que viram o filme antes de seu lançamento à convite da Globo, mas de uma forma diplomática e formal aprovaram o seu conteúdo que agora também contestam. O filme estava pronto e lhes foi mostrado sem nenhum pedido de aprovação ou não. Existem outros sensacionalismos explícitos como a esposa de Eder ser apresentada com um barrigão de grávida nas lutas contra Harada, no Japão (1965 em Nagoya e 1966 em Tóquio) quando Marcel, o filho mais velho estava presente, sua mãe, Cidinha também, mas Andréa só veio ao mundo em 17 de agosto de 1968, portanto, dois e três anos depois das históricas lutas no país do sol nascente. Cidinha, que faleceu em 10.05.2010,também jamais pediu a Eder que deixasse o boxe. Sempre o apoiou de forma entusiástica. E outra terrível maldade do filme e que deixou a família revoltada. Cidinha era uma jovem tímida, operária numa tecelagem e jamais que seu primeiro encontro com Eder tenha sido num frege onde Zumbanão ia em busca de aventuras sexuais. Estes fatos me permitiram, inclusive, no último sábado, dia 19 de janeiro falar com o próprio Eder que se não se lembrou da presença do tio Tonico Zumbano em Brasília, mas para minha alegria lembrou-se do velho locutor e lágrimas correram de seus olhos segundo relato de seu genro Antonio João. Como complemento deste trabalho e como testemunho da verdade confirmo que KID JOFRE deixou este plano em 1974, Dogalberto, o irmão número 2 da família faleceu em 1973 e compareci ao seu sepultamento no cemitério do Chora Menino em São Paulo onde estão todos da dinastia JOFRE/ZUMBANO que já partiram. Eder sempre teve um lado espiritualista e no triste momento que se vivia no sepultamento do irmão, sorrindo apontou para o alto da capela dizendo que o Doga estava lá, como sempre rindo e procurando alegrar a todos. Nesse capítulo agrego que alguns anos após a morte de KID o médium Chico Xavier recebeu do mesmo uma mensagem psicografada, informação que recebi diretamente da família, e na mesma o grande médium recebia palavras de incentivo a Eder pedindo que continuasse sempre trilhando os caminhos do bem, ajudando o próximo e mantendo a honestidade que a família sempre pautou. O outro irmão de Eder, Mauro, que só lutou entre amadores faleceu em 1963, ainda jovem e Ralf Zumbano, que disputou as Olímpiadas de 1948, grande peso-médio não foi sequer citado na filmagem. Como Eder, Ralf também foi vereador em São Paulo e deputado estadual paulista. São fatos que devem ser restabelecidos e são mentiras que não podem deixar de ser desmentidas e se tomo esse caminho é por considerar que o respeito à verdade em acontecimentos tão marcantes na vida brasileira não podem ser deturpados por uma visão comercial e fantasiosa buscando e colocando acima do real a ilusão farsesca que chama mais atenção. Quem viver verá o que se poderá falar no futuro de um Pelé e espero que haja então algum jornalista ou radialista que como eu, viu Pelé e Eder Jofre iniciarem e terminarem suas gloriosas trajetórias no esporte não só para recuperar imagens, mas principalmente para restabelecer a verdade verdadeira dos fatos.

(*) Texto publicado no blog Radioamantes a pedido do próprio autor.

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Narrador Flávio Araújo contesta fatos apresentados em minissérie sobre Éder Jofre

Por Flávio Araújo, especial para o jornal O Imparcial, de Presidente Prudente (*)

UMA MINISSÉRIE PRÁ LÁ DE MENTIROSA

A Rede Globo exibiu há poucos dias, ente 8 e 11 últimos em quatro capítulos, de terça a sexta-feira, uma minissérie tendo por base a carreira de EDER JOFRE, o maior pugilista brasileiro de todos os tempos e o melhor peso-galo da história do boxe em todo o planeta na opinião oficial dos pesquisadores norte americanos. Infelizmente o que o público brasileiro viu está longe de refletir com justiça e mesmo no aspecto moral o que foi a trajetória desse grande atleta. É preciso, antes de tudo, realçar que o boxe hoje perdeu aquela condição de ser a chamada “nobre arte” que tinha no passado. O boxe era um esporte que, se não podia deixar de lado o seu teor de violência, tinha uma visão artística inegável com os bailarinos no tablado como o próprio Eder, ou em escala maior os norte-americanos Cassius Clay ou “Sugar” Robinson, os meus eleitos na vanguarda da beleza desse esporte. A violência das lutas de hoje desse MMA mataram o boxe. Mas, o que se vê nessas disputas onde o Brasil ainda tanto se destaca não pode na minha ótica ser considerado como um esporte no sentido olímpico do termo.

A MINISSÉRIE DA GLOBO

Bem, devo dizer que fui convidado pela empresa que fez o longa metragem e a minissérie para participar dos mesmos e não pude atender o convite. Foi exatamente no período em que minha mulher, Yvette Pinheiro de Araújo, estava hospitalizada e veio a falecer. Morava então em São José dos Campos e hoje gozo as delícias do ar puro e clima agradável de Poços de Caldas mesmo no verão que esturrica o país. Assinei então uma concordância em que usassem minhas narrações para constar da produção e sei que não se pode falar na carreira desse artista dos ringues (Eder era também um desenhista de belíssimos traços em nanquim) sem mencionar a minha presença já que narrei a maioria de suas lutas como também, segundo o Milton Neves, fui o locutor que mais transmitiu os gols de Pelé. Desculpem a ausência de modéstia de quem começou irradiando os jogos de Corinthians e Prudentina na então PRI-5 de minha cidade natal que amo e que, mesmo lá não residindo, está sempre presente em meu coração prudentino. Muito me orgulho do imerecido título de “cidadão benemérito” de minha terra. Deixa isso prá lá e vamos em frente. Sei muito da trajetória de Eder. O porquê? Quando Pedro Luiz e Mário Moraes deixaram a Bandeirantes e senti que poderia ser também o locutor titular de boxe fui procurar Kid Jofre na sua Academia, na rua Santa Efigênia e que era patrocinada pelo São Paulo F.C.. Subi ao ringue e fiz um treinamento de aprendizado com o próprio Eder.

EDER JOFRE NASCEU NUMA ACADEMIA DE BOXE

Agrego que Eder nasceu na primeira academia dirigida por seu pai e que ficava na rua do Seminário, no centro de São Paulo. A partir do que narro nos tornamos grandes amigos e durante muitos anos, praticamente todos os meses, ficávamos um largo tempo ao telefone. Eu telefonava num mês no outro ele me procurava. Eder recorria ao velho Flávio para recordar muita coisa que já não estava por último em sua memória e que para mim é algo como se os vivesse agora. Mesmo com o peso de tantos anos tenho uma memória de elefante. Era o prenúncio do mal que o acomete no presente. Uma encefalopatia traumática e que no passado era conhecida como demência pugilística. Não se trata de Alzheimer segundo a família. Milton Rosa, Fernando Barreto e Paulo de Jesus, grandes pugilistas brasileiros nas décadas de 1960/70 sofreram desse mal. Está muito em voga nos Estados Unidos por estar vitimando jogadores do futebol americano. E também aqui no Brasil pelos choques cabeça-cabeça entre os profissionais de nossos gramados. Bellini o grande capitão do primeiro mundial da FIFA que o Brasil conquistou deixou em testamento seu cérebro para estudos na medicina da USP. Mas, voltando ao programa da Rede Globo este foi construído em cima de sucessivas mentiras. As lutas ali exibidas, contra Medel e contra Legra são figurações com sósias dos lutadores de então. E a narração que consta nos créditos como sendo minhas e do Pedro Luiz não são de nenhum dos dois. O locutor que as profere, de boa qualidade, deve ter escrito as minhas narrativas e decorado ou lido na hora do trabalho. Usa também as minhas frases e minha inflexão. Do Pedro Luiz, que considero o maior locutor esportivo do Brasil em todos os tempos não tem absolutamente nada. Pedro nos deixou há muito tempo.

KID JOFRE JAMAIS FOI AGRESSIVO COM EDER

Aristides Jofre jamais foi um carrasco para Eder como no filme é mostrado. Tinha, sim, seus momentos de azedume, mas era um admirador do filho e um homem de bom trato. Como Eder, era um gozador e piadista inveterado e jamais trataria um pupilo, ainda mais sangue do seu sangue e sua maior esperança de sucesso como técnico de boxe e de ganhar um título mundial. Kid Jofre, antes de vir para o Brasil ordenhava vacas leiteiras em San Justo, ao sul de Buenos Aires. Os empresários de Eder jamais foram malandros como o filme quer exibir e o grego/americano George Parnassus jamais teria declarado que só pagaria 10% da bolsa combinada se Eder, na luta contra Medel, caísse antes do 5º assalto e não houve em momento algum aquela ironia dos jornalistas norte-americanos menosprezando o lutador brasileiro, chamando-o de gorila principalmente por parte de Parnassus, que já tinha vindo ao Brasil para vê-lo em ação e sabia de seu valor. Pura exploração de um desenfreado sensacionalismo.

O ABSURDO DOS ABSURDOS!

E pasmem! Absurdo dos absurdos. Eder não ganhou o título mundial dos galos na luta contra Medel como insinuam os filmes. O campeão era Joe Becerra, também mexicano e estava acertado que Eder e Medel competiriam para saber quem teria o direito de desafia-lo. Acontece que Becerra nesse Ínterim perdeu o título mundial para o desconhecido Eloy Sanchez, outro mexicano e tiveram que reformular a ordem geral e a luta entre Eder Jofre e Joe Medel classificaria um dos dois para lutar contra Eloy Sanchez, o que aconteceu no dia 18 de novembro de 1960 no Olympic Auditorium, de Los Angeles, onde também Eder nocauteara Medel, ambos os duelos presenciados por 10 mil mexicanos entusiasmados e por meia dúzia de brasileiros que para lá viajaram. No filme e na minissérie Eder é anunciado pelo locutor como desafiante quando o que havia em seguida seria um duelo classificatório para que o vencedor realmente adquirisse condição de desafiar depois o campeão. Considero que a minissérie não fez justiça a grande família dos Jofre/Zumbano, a maior dinastia do boxe que o Brasil já teve e que nenhum país do mundo jamais terá e se dou esse testemunho nestes escritos é para que as gerações atuais que sequer conheceram Pelé e muito menos a Eder Jofre saibam que houve um dia em nossas plagas um craque vestindo luvas e esgrimindo no tablado como um Nijinski, Nureyev ou Baryshnikov. Irradiei também as lutas desse gênio da então nobre arte no Japão em 1965 e 66 e a primeira é até hoje o recorde brasileiro de audiência numa única transmissão esportiva. Eder era um peso galo com “pegada” de peso médio e que depois em 1973, já com 37 anos, conquistou ainda o título mundial dos penas em combate histórico travado em Brasília diante do cubano naturalizado espanhol, José Legra, também um fora de série, mas que foi vencido de forma inexorável pelo talento de nosso maior craque dos ringues de ontem, hoje e amanhã.

(*) Texto publicado no blog Radioamantes a pedido de seu autor

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