Zé Nogueira, o contador de histórias

Por Marcos Lauro

O produtor Zé Nogueira como Einstein - Foto: Reprodução/Facebook
O produtor Zé Nogueira como Einstein – Foto: Reprodução/Facebook

Faleceu no inicio desta quinta-feira (30), aos 89 anos, o produtor José Nogueira Neto. Zé Nogueira, como era conhecido, trabalhou na Rádio Eldorado por cerca de 40 anos e acompanhou as mudanças da emissora – de local e de estilo. Além disso, foi também produtor de shows e eventos e trabalhou com gente como Adoniran Barbosa, Chico Buarque, Elis Regina, Toquinho, João Donato, Paulinho da Viola e Frank Sinatra – este último, quando coordenava os shows do night club do Maksoud Plaza e o hotel estava no seu auge em termos de programação e requinte. Era um luxo! Também acompanhou Ella Fitzgerald em sua passagem por São Paulo, usando seu fusquinha como meio de locomoção da cantora.

Trabalhar com Zé Nogueira na redação da rádio era uma festa. Aos 80 e tantos anos, ainda produzia (e muito bem) alguns programas como “A Cara do Jazz” (com apresentação de Paulo Caruso) e o “Adega Musical”, do sommelier Manoel Beato. História de bastidores: era tradição beber vinho durante as gravações desse programa, até que a direção baixou uma ordem que proibia alimentos e líquidos dentro dos estúdios. Zé Nogueira bateu o pé e argumentou que não fazia sentido fazer um programa sobre vinhos e afins sem beber. Conquistou o direito de serem os únicos com essa permissão e a tradição seguiu.

Estar com Zé Nogueira no dia a dia era ver, do nada, ele te trazendo uma carta carinhosa que a Elis Regina escreveu pra ele logo depois de dar um esporro no velhinho – Zé já tinha cabelos grisalhos há muito tempo. O causo: Depois de um show, Elis foi comer com os músicos e Bôscoli estava cansado, resolveu voltar para o hotel. Zé resolveu acompanha-lo. Os dois foram para o quarto do casal Bôscoli-Elis e resolveram dar uma encostadinha pra descansar… pegaram no sono. Eis que Elis chega, pega aqueles dois homens deitados em sua cama e começa a berrar, expulsando Zé do quarto. Depois veio a cartinha, com direito a coração desenhado. Essa carta ainda existe, foi guardada por Zé Nogueira assim como muitos outros itens – a exposição sobre Adoniran no Farol Santander, em São Paulo, contou com itens cedidos pelo produtor, assim como uma exposição anterior sobre Elis, organizada pelos herdeiros.

Sem querer, Zé já me abriu portas e suavizou caminhos com pelo menos dois artistas famosos por serem avessos a entrevistas: um porque tinha Zé como um padrinho e outro porque foi apresentado a Chico Buarque pelo Zé. É um nome que abre corações e mentes.

A redação com Zé tinha trabalho, mas também tinhas essas histórias que beiravam o surreal e um espírito jovem, quase de criança – como quando Zé se candidatou a um cargo na Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA) do Grupo estado e saiu pelo prédio com um cartaz todo improvisado escrito “VOTEM EM MIM”. Ganhou, claro E depois ficava tirando sarro dele mesmo: “Se esse prédio pegar fogo, fiquem tranquilos que esse velhinho aqui é o brigadista”.

Zé me ensinou até que o grito de “chupa!” nos estádios de futebol não tem conotação sexual alguma. Quando jovem, ele se lembra que provocavam outras torcidas de times que não saíram vencedores com gritos de “Perderam! Fiquem aí chupando o dedo!”. Nessa mania que a gente tem de ficar diminuindo as coisas, virou o “chupa!” de hoje. E, me desculpe, mas eu acredito num senhor que nadou num rio Tietê limpo com os amigos.

Zé Nogueira se foi, mas as histórias ficam, vivíssimas. Amigos têm horas e horas de áudios com entrevistas com o Zé contando dezenas dessas histórias do universo da música e do rádio. Ainda não sabem o que fazer com esse material, mas pode ser que tudo fique imortalizado em breve. Vamos torcer.

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